Assunto que sempre ocasiona dúvida em proprietários, síndicos e locatários está relacionado ao direito de voto dos inquilinos nas Assembleias Gerais de Condomínio. O debate ocorre em razão da falta de clareza e de uniformidade na legislação aplicável à matéria. Para que seja possível chegar a uma conclusão, é necessário interpretar três legislações diferentes: o Código Civil, a Lei de Condomínios e Incorporações e a Lei de Locações.
A Lei de Condomínio e Incorporações, que entrou em vigor no ano de 1964, prevê expressamente no art. 24, §4º que o locatário poderá votar nas pautas assembleares que não envolvam despesas extraordinárias do condomínio, desde que o condômino/locador não compareça à solenidade:
Art. 24. Haverá, anualmente, uma assembléia geral ordinária dos condôminos, convocada pelo síndico na forma prevista na Convenção, à qual compete, além das demais matérias inscritas na ordem do dia, aprovar, por maioria dos presentes, as verbas para as despesas de condomínio, compreendendo as de conservação da edificação ou conjunto de edificações, manutenção de seus serviços e correlatas.
[...]
§ 4º Nas decisões da Assembléia que não envolvam despesas extraordinárias do condomínio, o locatário poderá votar, caso o condômino-locador a ela não compareça.
Embora exista expressa previsão legal neste sentido, existe divergência sobre a vigência do referido texto de lei. Parte dos julgadores entendem que o referido dispositivo legal fora revogado pelo atual Código Civil, por se tratar de uma lei nova (que se sobrepõe à mais antiga). Esse entendimento parte da premissa de que o art. 1.335, III estabelece de que este é um direito do condômino, não tendo sido estendido ao locatário:
Art. 1.335. São direitos do condômino:
[...]
III - votar nas deliberações da assembléia e delas participar, estando quite.
No entanto, outra parcela dos julgadores entende que a Lei de Condomínios e Incorporações é uma lei especial que trata especificamente sobre o assunto, sobrepondo-se inclusive à lei nova. Relevante, também, o argumento de que o art. 24, parágrafo quarto da Lei de Condomínios e Incorporações não conflita com o art. 1.335, II do Código Civil. A normas não são colidentes e, por este motivo, entende-se que podem coexistir de maneira harmônica.
Em razão da lógica legislativa, portanto, o locatário poderá votar na Assembleia desde que o condômino/locador não compareça na solenidade e que não estejam em pauta despesas extraordinárias e outras matérias relacionadas ao direito de propriedade. Para que se entenda o que seria despesas extraordinárias, podemos recorrer ao art. 22 da Lei de Locações:
“Art. 22 [...]
Parágrafo único. Por despesas extraordinárias de condomínio se entendem aquelas que não se
refiram aos gastos rotineiros de manutenção do edifício, especialmente:
a) obras de reformas ou acréscimos que interessem à estrutura integral do imóvel;
b) pintura das fachadas, empenas, poços de aeração e iluminação, bem como das esquadrias
externas;
c) obras destinadas a repor as condições de habitabilidade do edifício;
d) indenizações trabalhistas e previdenciárias pela dispensa de empregados, ocorridas em data
anterior ao início da locação;
e) instalação de equipamento de segurança e de incêndio, de telefonia, de intercomunicação, de
esporte e de lazer;
f) despesas de decoração e paisagismo nas partes de uso comum;
g) constituição de fundo de reserva.”
A discussão ainda não foi enfrentada diretamente pelo Superior Tribunal de Justiça, responsável por uniformizar o entendimento, de modo que é possível encontrar decisões conflitantes sobre o tema. A tendência, contudo, é que a interpretação harmônica das legislações conduza ao entendimento de que é possível ao locatário votar na assembleia, desde que cumpridos os requisitos previstos no art. 24, §4º da Lei de Incorporações e Condomínios.
Autor (a): Dr. Rafael Weyne Vargas - OAB/RS 85.086
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