Acórdão proferido pelo Supremo Tribunal Federal vem passando despercebido por locadores e imobiliárias, que precisam estar atentas à repercussão desta decisão nas garantias locatícias.
As garantias locatícias são (e sempre foram) um dos principais elementos na construção de um contrato de locação, seja de natureza residencial ou não residencial (comumente denominado comercial). Mesmo diante de recentes atualizações legislativas, a modalidade mais recorrente de garantia continua sendo a fiança pessoal, prevista no art. 37, II do Lei 8.245/91 (Lei de Locações).
E é por este motivo que recente julgado do Supremo Tribunal Federal poderá ocasionar diversos problemas para locadores de imóveis comerciais. Isso porque a Primeira Turma daquela Corte apreciou o Recurso Extraordinário nº 605.709/SP, em que o fiador do locatário de uma sala comercial arguia a impenhorabilidade do seu imóvel por se tratar de bem de família.
A inconformidade do fiador litigava contra a consolidada jurisprudência do STF sobre a matéria, que até então aplicava os termos do art. 3º, VII da Lei 8.099/1990 sem qualquer distinção entre locações residenciais ou comerciais. Apenas para fins de elucidação, o mencionado dispositivo está assim redigido:
Art. 3º A impenhorabilidade é oponível em qualquer processo de execução civil, fiscal, previdenciária, trabalhista ou de outra natureza, salvo se movido:
[...]
VII - por obrigação decorrente de fiança concedida em contrato de locação.
A interpretação do dispositivo colacionado acima não deixa margem para muitas interpretações, subsumindo-se que a impenhorabilidade do bem de família não é oponível para obrigações decorrentes de fiança concedida em contrato de locação, não existindo distinção entre a natureza do contrato (residencial ou comercial).
No entanto, ao realizar uma interpretação em conformidade com a Constituição Federal, a Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal, por maioria de votos, acolheu o recurso apresentado pelo fiador, assentando que o bem de família do fiador de contrato de locação comercial é impenhorável para dívida decorrente de contrato de locação de natureza comercial, prevalecendo o voto da Ministra Rosa Weber.
Dada o provimento do recurso e o reconhecimento da Repercussão Geral da matéria, o resultado deste julgamento deverá ser replicado nos demais casos que discutam idêntica questão nas instâncias inferiores. Na prática, isso significa que a garantia fidejussória pessoal para contratos de locação comercial fora mitigada pelo Supremo Tribunal Federal, notadamente para os fiadores que possuem apenas um imóvel residencial em seu nome.
Embora ainda caiba recurso desta decisão, o processo se encaminha a passos largos para a sua finalização (trânsito em julgado), tendo sido rejeitados os embargos de divergência (recurso cabível para quando existem outros precedentes em sentido contrário) em decisão monocrática proferida pelo Ministro Celso de Mello, publicada em 08 de outubro de 2020.
Diante destes elementos, a probabilidade maior é de que a decisão que reconheceu a impenhorabilidade do bem de família do fiador para dívidas decorrentes de locação comercial seja confirmada, competindo aos locadores e às imobiliárias adotarem cautelas jurídicas para evitar que situações com esta impeçam a recuperação de eventuais créditos de locatícios, principalmente na construção dos seus contratos de locação (e revisão dos antigos).
Autor (a): Dr. Rafael Weyne Vargas
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